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24 de Abril de 2024

A inserção de cartões informativos no interior das embalagens de cigarros não constitui prática de publicidade abusiva apta a caracterizar dano moral coletivo.

STJ - REsp 1.703.077

há 5 anos


A Lei nº 9.294/96 estabelece que as fabricantes de cigarro são obrigadas a inserir, nas embalagens e nos maços do produto, uma imagem e uma mensagem informando sobre os malefícios do tabaco para a saúde. O que algumas fabricantes de cigarro começaram a fazer? Inseriram, dentro das embalagens, um “cartão” móvel, de papel, do tamanho exato da embalagem. Um dos lados do cartão traz a mensagem e a foto determinados pelo Ministério da Saúde. No entanto, é possível virar o cartão e, neste outro lado, há o logotipo da empresa. Assim, o consumidor pode retirar do plástico esse cartão e virar o seu lado, de forma que a mensagem e a imagem de advertência ficarão cobertos. O STJ entendeu que a inserção de cartões informativos no interior das embalagens de cigarros não constitui prática de publicidade abusiva apta a caracterizar dano moral coletivo. O suposto dano moral coletivo estaria alicerçado na possibilidade de o consumidor utilizar os cartões para obstruir a advertência sobre os malefícios do cigarro. Assim, a responsabilidade civil estaria sendo imputada a alguém que não praticou o ato, além do dano ser presumido, uma vez que não se tem notícia que algum consumidor os teria utilizado para encobrir as advertências. O fumante que se utiliza dos cartões inserts ou onserts quer tampar a visão do aviso dos malefícios que ele sabe que o cigarro causa à saúde. STJ. 3ª Turma. REsp 1.703.077-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Moura Ribeiro, julgado em 11/12/2018 (Info 642). Fonte: Dizer o Direito

Trata-se de ação coletiva interposta pelo MPF-SP, com litisconsórcio passivo ulterior do Instituto Barão de Mauá de Defesa de Vítimas e Consumidores Contra entes poluidores e maus fornecedores, movida em face da Souza Cruz S.A, onde se questiona a abusividade da conduta desta em inserir cartões dentro da embalagem com o logotipo da empresa.

Houvera sentença de procedência, com condenação de R$ 1.000.000,00 por danos morais coletivos, confirmado pelo TRF da 3ª Região.

Interposto Recurso Especial pela Souza Cruz ao STJ, argumentou-se, basicamente, que não há vedação legal à utilização de cartões publicitários informativos “inserts” e “onserts” no interior das embalagens de cigarros, pois não há prática de publicidade, uma vez que tais mecanismos de informação se dirigem unicamente ao público fumante e que já consome o produto. Ademais, sustenta que referidos cartões visam, em verdade, informar o consumidor sobre as características do produto e identificar o produto como original, bem como o reconhecimento da prescrição, pois caso houvessem, os danos morais resultariam de fato do produto, com prazo prescricional de cinco anos contados da data do conhecimento do dano, sendo certo que o início da utilização de referidos cartões se dera em 1995.

Nada obstante, a Ministra relatora Nancy Andrighi afastou a preliminar de prescrição, uma vez que no caso presente a violação do direito é continuada e, assim, a ação reparatória pode ser ajuizada enquanto perdurar o dano que, no caso, ocorreu em 2002, tendo sido a ação coletiva ajuizada em 2004.

Ademais, salientou que as leis restritivas de publicidade do tabaco não distinguem a publicidade em relação ao seu destinatário, sendo a rígida regulamentação da propaganda de produtos fumígenos destinada não apenas às pessoas que não são consumidoras do produto, mas também àquelas que já são consumidores, reforçando-se, ainda, a hipervulnerabilidade dos consumidores de tabaco.

Destarte, negou provimento ao Recurso Especial interposto pela Souza Cruz.

Em que pese sua relatoria, prevaleceu o voto-vista do Ministro Moura Ribeiro, por entender não haver publicidade nos cartões inserts e onserts e, ainda que se considerasse como tal, não haveria abusividade, uma vez que não proporcionam nenhum incentivo ao fumo, em atenção a legislação restritiva. Ademais, o suposto dano moral alegado estaria alicerçado na possibilidade do consumidor usar os cartões para encobrir as advertências contidas no produto, o que seria imputar a responsabilidade civil àquele que não praticou o ato, além de ser presumido, uma vez que não se teria notícias de consumidores que tomaram referida atitude.

Por fim, salientou que já houvera concessão da ordem em mandado de segurança em que se anulou multa administrativa imposta pela ANVISA pelo mesmo motivo ora esposado, qual seja, utilização dos cartões no interior das embalagens, com desprovimento de Recurso Especial interposto, com trânsito em julgado. Destarte, haveria, com a manutenção do voto da Relatora, violação a coisa julgada proferida no Mandado de Segurança, não se podendo reconhecer a ocorrência de dano moral pelo mesmo fato lá delineado.

Neste diapasão, afastou-se a ocorrência do dano moral coletivo, julgando improcedente o pedido da Ação Civil Pública, sendo acompanhado pelos Ministros Ricardo Villas Bôas e Marco Aurélio Bellizze, vencidos a Relatora Ministra Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino, tendo ocorrido o trânsito em julgado em 13 de março do corrente.

De fato, inclino-me na posição do voto-vencedor, uma vez que me parece haver um afastamento da conduta da Souza Cruz, no que se refere a inserção de cartões no interior da embalagem, com o conceito de publicidade. Ademais, e, mais claramente, ainda que fosse considerada uma publicidade, não há qualquer abusividade a afrontar a legislação restritiva, uma vez que, de fato, não há nenhum incentivo ao ato de fumar.

Salientando-se que no Brasil há uma restrição à publicidade do tabaco e não uma proibição, sendo certo que sobre qualquer viés (com ou sem publicidade) é equivocado o entendimento que condena a Souza Cruz por um ato que não lhe é proibido ou, ainda, por uma presunção de atos dos seus consumidores.

Destarte, considero que andou bem a maioria do STJ em dar provimento ao Recurso Especial interposto pela Souza Cruz, com o consequente julgamento de improcedência na ação coletiva de danos morais.

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